Eliana Caminada
Nasceu Eliana Maria
Vieira Boamorte em 16/051947. Usou o Caminada que era o sobrenome de seu pai
Caminada Boamorte. Na época não gostava do nome, mas hoje se orgulha dele pela
historia da família.
Iniciou seus
estudos de ballet aos 5 anos na Escola Cultural de Arte que pertencia a uma
violinista do Theatro Municipal e da radio nacional. Quem dava aula era Sandra
Dieken, Primeira bailarina do Corpo de baile do Theatro Municipal.
Sempre foi muito a
teatro, opera e saraus de poesia. Foi ao TM pela primeira vez aos 3 anos
assistir Coppelia, dançado por Tamara Cappeler. Saiu dizendo – quero ser aquela
moça (a boneca de Coppélia). “Tenho o visual até hoje, com um laço cor de rosa
bem grande na cabeça. “
O pai havia sido
educado na Inglaterra e desde cedo introduziu Eliana no mundo das artes. Ele,
conta Eliana, era muito diferente de toda a família em questão de gosto, eles
gostavam de outras coisas, ele e meu avô. Ele era professou mas amou a vida
inteira o mundo artístico e trouxe a minha mãe para isso também.
Professores – além
da Sandra Dieken, uma professora argentina que, ao voltar para a Argentina,
sugeriu que ela fosse fazer aulas com Nina Verchinina. Entretanto Verchinina
disse que ela não tinha nenhum perfil de bailarina moderna e as aulas de
clássico dela eram dirigidas para quem fazia moderno e indicou Tatiana Leskova
com quem ficou a vida inteira. Até hoje se relacionam como aluna e professora.
Outra Eric Valdo, seu marido, mas já depois de bailarina formada. Leskova era
mais para sala de aula e Eric para o palco. E a Escola de Danças do Theatro
Municipal do Rio de Janeiro (atual Escola Estadual de Danças Maria Olenewa).
Entrou no que seria atualmente o terceiro médio, aluna de Renné Wells. No exame
final tirou nota 10 e pulou para o que seria hoje o segundo técnico (antigo
sétimo ano). O oitavo ano (terceiro técnico atual) era de estagio no corpo de
baile. No ano em que estava no sétimo ano houve um concurso para o corpo de
baile. Apesar da idade, (não tinha completado 16 anos, se inscreveu junto com
Nora esteves que também não tinha completado 15 anos) se inscreveram sem
ninguém saber, nem os pais. Ainda levaram “uma bronca” da Leskova porque não
perguntaram a ela se estava na hora de fazer prova. Passaram as duas. Na época
era aluna do 7º no, e seria aluna de Consuelo Rios. Acabou não cursando mais a
Escola porque já era estava no Corpo de Baile como contratada. Isso foi em
1963. Em 1965 houve um outro concurso que, também prestou, mas agora já com 18
anos. No primeiro passou em segundo lugar e Nora em primeiro. No segundo, “como
a Nora não fez, passei em primeiro lugar”.
Entrou para a Cia
em 1963, porque queria “ser aquela bailarina que eu vi aos 3 anos de idade”.
Isso foi uma coisa obsessiva na vida, mas ajudou em tudo – a fazer regime, a
ser disciplinada, no colégio. O Theatro era o caminho, e era um caminho lindo.
Era um fascínio pelo prédio, pelos artistas. A proximidade que a Escola tinha
com o Theatro já começava a te preparar para o que você iria ser. Lembro que
fugíamos de bata (as alunas usavam uma capa branca para atravessar a rua para
chegar ao prédio da Escola) para assistir os ensaios. “A Glorinha (moça que
cuidava das alunas da Escola dentro do Theatro) ficava maluca”. Ensaios e espetáculos.
Nos escondíamos na galeria e depois íamos descendo. Assim eu vi até Vittorio
Gassman, era lindo.
ROTINA
Aulas e ensaios –
09:30 as 14:30. Tínhamos 15 minutos para um lanche no bar/cantina que era lá em
baixo. Só íamos até mais tarde em casos especiais como na época do Lander e do
W. Dollar.
PERIODOS MELHORES E PIORES
O período mais
marcante foi o ano da minha entrada – 1963/1964. Ainda era a Tatiana Leskova e
com ela dancei muita coisa inclusive Galo de ouro, que para mim é inesquecível,
é uma opera ballet e pelo encantamento de estar ali, participar de opera, e o
compromisso de trabalho que me preenchia a vida, era tudo que eu queria. Outra
época marcante não foi a que dancei papeis principais, mas o ano em que a Cia
era dirigida por William Dollar, que eu adorava. Adorava o que ele fazia,
gostava dele pessoalmente, era um homem educadíssimo. Fui construindo com ele a
minha carreira. Quando terminei aquele ano achei que o próximo seria muito bom
para mim, mas não aconteceu esse novo ano porque o Dollar não voltou. O Corpo
de Baile foi dirigido pela Helba Nogueira. Era uma coisa provisória, começaram
a rarear as temporadas, poucos espetáculos. A temporada do Skibini, na qual eu
não dancei nada a não ser Preludio de Shylphides, mas nunca recebi um aplauso
tão longo, tão demorado como nessa apresentação. Dessas coisas que a gente não
esquece mesmo, as meninas já estavam com os braços caindo e o maestro não
recomeçava porque não paravam os aplausos.
Quando dancei
Corsário com o Aldo (Lotufo). Até porque dançar com o Aldo era um privilegio,
era o sonho das bailarinas. Já tinha dançado com ele no corpo de baile quando
ele foi substituir um colega que precisou viajar e era eu quem dançava com ele.
Foi uma experiência maravilhosa.
Dancei com (Oscar)
Araiz e foi minha experiência com contemporâneo. Foi muito bom, adorava o que
fazia no ballet. Foi um tempo de mais reconhecimento quando fui contratada para
Munich. Fui contratada como baby solista, mas não queria ir. Todos achavam um
absurdo eu não querer ir, já tinha filho, não me via vivendo longe daqui. Acho
até que me machuquei por isso.
CURIOSIDADES
Coisas das mais
significativas foi meu noivado. Começamos a namorar numa viagem do Corpo de
baile a Belém. Meus pais já se davam com todo mundo do Theatro. Eric ia a cada
do papai, todo mundo ia. Eles me recomendaram ao Eric – “olha a Eliana”.
Ficamos noivos aqui no Rio uns dois ou três meses depois. Eric dizia que
namorar bailarino tinha que dizer logo que era coisa séria. Ficamos noivos no
dia que o Ceslau, que era corista (membro do Coro do Theatro) do Theatro, mas
que vendia joias também, (ninguém ganhava o suficiente para viver) levou as
alianças, compradas a prazo pelo Eric. Ficamos noivos na porta dos fundos do
Theatro.
Tinham coisas muito
engraçadas. A Sandra Dieken, que tinha sido minha primeira professora a essa
altura já era minha colega do Theatro, era muito engraçada. Sandra e David
(Dupré) faziam uma relação dos filmes em cartaz e atribuíam um filme a cada
pessoa e as vezes dava cada rebú!!!! Puseram um filme Naná (que era uma
prostituta) e do lado Maryla Gremo. Quando ela viu ficou uma fera. Tinha o
Credo do Corpo de baile que falava de todos desde a Olenewa, das viagens, do
sapato de ponta, das aulas diárias e da Dirce eterna amém. Ela é eterna mesmo
está viva até hoje e, naquela época já era velha para nos. Outras duas pessoas incríveis
eram Dennis(Gray) e David (Dupré), eram hilários. Viviam fazendo brincadeiras.
No Sonho, do ballet Descobrimento do Brasil, inventavam coisas estapafúrdias.
Um dia o Dennis resolveu plantar uma bananeira e o David puxou a malha dele e
ele ficou só de sunga. Foram os dois suspensos
Num ensaio a
Leskova saiu para atender o telefone e quando voltou quatro bailarinos no lugar
de quatro bailarinas – David, Dennis, Johnny e Arthur.
Geraldinho (Geraldo
Cavalcante também era muito engraçado. Havia uma sala antes da sala de aula que
era a sala do ponto (local onde ficava o livro para que assinássemos antes de
entrar na aula. Nessa sala também ficávamos esperando o nosso ensaio começar.
Ficava um silencio danado. De repente o Geraldo soltava uma gargalhada e dava
uma cambalhota de cima da cadeira, fazendo um barulho danado. Ninguém tinha
percebido que ele tinha se enrolado todo em jornal e o jornal fazia um barulho
enorme. Ele fazia ponta feito as moças e fazia horrores nas pontas. Um dia num
desfile de carnaval no baile do Theatro ele apareceu de Pião e atravessou a
passarela em chaîné.
Durante a aula
também o pianista não podia tocar Fascinação porque começava a cantoria. A
Sandra começava, o Arthur (Ferreira) que estava dando aula e passava por ela, e
ela parava, mas o David continuava na outra barra, daqui a pouco estava todo
mundo cantando. O Arthur parava a aula e dizia que dispensava o coral e
começava tudo de novo. Dançar com o David era um perigo ele era muito gozado.
Ele era meu ídolo. Fazia um Fauno de Aprés
midi insubstituível, nem (Rudolf) Nureyev era melhor. A montagem era da
Leskova e era a mais próxima dos bailarinos e acho que era a mais fiel que já
se fez.
BALLETS QUE DANÇOU
Giselle e Sylphides eu
fazia todos os lugares possíveis.
BAILARINOS DA EPOCA
Johnny Franklin,
Dennis Gray, Ricardo Abelan, Antônio Barros, Décio Otero, Emilio Martins, Eric
Valdo, Reginaldo Vaz, Edmundo Carijó, Jonas Santos, Armando Nesi, Renato
Magalhaes
Sandra Dieken,
Eleonora Oliosi, Alice Colino, Cecilia Waisntock, Bertha Rosanova, Ruth Lima,
Rojan Cavina, Irene Orazem, Slava Goulenko, Oneide Craveiro, Alda Marques,
Helga Loreida, Dirce Garro, Nora Esteves, Regia Pavier, Lourdes
Braga, Cristina Maartinelli, Lourdja Mesquita
DIRETORES
Eram os chefes do
Corpo de baile, um cargo administrativo – Lorival, Sebastiao Araujo, Tatiana
Leskova Leskova, William Dollar, Helba Nogueira.
Nesse meio tempo
veio D, Eugenia (Feodorova) fazer uma temporada, Leskova volta para outra
temporada, Jorge Garcia
Em 1974 o Theatro
entrou em obras e tudo começou a parar. Em 1976 houve uma grande cisão do
Theatro, muita gente boa saiu porque nada foi considerado. Eles queriam renovar
o Corpo de baile. Fizeram isso de uma maneira antiética e cruel. Deram para os
bailarinos uma cartinha dizendo que a partir do dia seguinte eles não estariam
mais no Corpo de baile, o salário seria preservado, mas que eles levassem todos
os seus pertences e que datassem e assinassem em baixo. Não deixavam sair sem
assinar a carta e isso gerou uma grande confusão. Uma das meninas conseguiu
sair. Era a Marlene Barroso que conseguiu um mandato de segurança em 24hs pelo
direito de trabalharem e retornaram. Ficamos de fora eu, Aldo e Eric, que na
época era assistente do Garcia – não recebemos a carta, mas Bertha recebeu,
parece mentira. Isso para muitos de nós foi inominável. Bertha para nós era uma
figura muito importante. Como pode tratar uma artista que significava o que
significava para nós, que tinha um título que nunca mais foi concedido a
ninguém – Prima Ballerina Absoluta - tinha o amor do público dessa forma. Não
foi nem convidada a assumir outro cargo, alguma coisa nada. E mesmo o pessoal
antigo, que de fato estava antigo, alguns já quase na época de se aposentar,
mas muitas vezes não se aposentavam porque não tinham tempo de serviço, e ninguém
tinha interesse em regulamentar isso. Esses antigos foram a própria história da
Cia., não podiam ser tratados dessa maneira. As barras, os espelhos, as
divisórias dos camarins, tudo isso tinha sido comprado por essas pessoas.
Trabalharam muito tempo sem receber, ou dos da verba 103 que levavam 3 meses
para receber. Eric morava em Santa Teresa numa vaga de quarto junto com o Aldo
para poder viver. Eles desciam a pé porque não tinham dinheiro para o bonde.
Todos os rapazes viviam assim. As moças nem tanto porque tinham família, mas os
rapazes não podiam contar com suas famílias ou porque os rejeitavam ou por eles
mesmos deixarem as casas para não constranger as famílias. Eu acho que não
podia ter sido feito desse jeito., principalmente assinado por um estrangeiro
que estava chegando, não conhecia a história da Cia., que era o Jorge Garcia.
Sabíamos que existiam coisas por trás, mas isso gerou uma reação das pessoas. O
Eric, por exemplo, se indispôs com o Garcia na mesma hora. Ele (Garcia) entrou
na sala, viu as pessoas e disse que não entrava na sala para dar aula. O Eric
disse então o Sr. Dá para quem quiser e eu dou a aula deles. Não foi uma reação
de todos, mas da maioria. Continuaram tentando ver como solucionar o problema e
resolveram dar um papel para optar pela FUNTERJ – Sim ou Não – Esclareça os motivos,
date e assine. Ninguém sabia o que ia acontecer nem o que era FUNTERJ.
Procuraram um advogado e ele disse que aquilo era praticamente uma procuração e
ainda com espaço em branco para acrescentarem o que quisessem. O advogado
cortou o espaço em branco e fez um outro documento dizendo que não queríamos
optar. Isso não foi bem recebido pela direção. Colocaram nas nossas mãos a
opção de permanecer ou não e nós devolvemos para eles. Todos os que usaram essa
resposta do advogado foram colocados à disposição da secretaria de Cultura e
todos os que responderam SIM ou NÃO, permaneceram no Theatro, mesmo os que
responderam - Não. Foi nessa época que saímos eu, Eric Aldo. Ficou muito pouca
gente, um pessoal muito novo que também não sabia o que estava fazendo nem o
que estava acontecendo, eram todos celetistas. Nós éramos estatuários, era mais
difícil, não puderam nos colocar na rua nunca.
REMONTAGEM DE BALLETS
Remontei muito, eu
e Eric, eu e Geraldo. Eu tinha boa cabeça e, além disso tinha dançado em
Giselle, por exemplo, todos os papeis. Remontei Giselle, Grand Pas Hongrois de
Raymonda, muita coisa. Eu colocava o ballet em pé e o Eric continuava
ensaiando. Ele era um bom ensaiador, bom adaptador de ballet de repertorio. A
Leskova disse que teria sido um coreografo se tivesse sido mais ambicioso, ele
tinha talento como coreografo.
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